quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Os anos Rebeldes




















Seria muito difícil imaginar o que seria a sociedade mundial de hoje sem considerar as enormes influências trazidas pelos anos 60, especialmente a partir da sua segunda metade até o início dos anos 70. Ali foram fortalecidos conceitos que nos são caros até hoje, como a igualdade social para pessoas de raças diferentes e entre homens e mulheres, a liberdade sexual (principalmente com o advento da pílula anticoncepcional) e a luta por direitos políticos e liberdade de expressão.

Tudo isso foi resultado de uma efervescência fantástica no campo de produção cultural e de alteração do próprio comportamento individual, de complexidade tamanha que até hoje, passados quase 40 anos, ainda é muito difícil identificar o que um exatamente sofreu influência ou influenciou.

No Brasil, um dos pontos mais marcantes dessa história foi relatado pela minissérie Anos Rebeldes, da Rede Globo. Produzida e levada ao ar em 1992, tendo como musas as atrizes Cláudia Abreu e Malu Mader, Anos Rebeldes sem a menor dúvida insuflou os ânimos dos adolescentes naquele ano para protestarem em todo o País para a cassação do então presidente Fernando Collor de Mello, acusado de acobertar casos de corrupção em seu governo.

Ao ver na minissérie global toda a mobilização dos jovens brasileiros contra o regime ditatorial implementado no País após o Golpe de Estado de 1964, muitos seduzidos pelo "glamour dos companheiros" tomaram para si a luta de retirar Collor do poder.

O fato é que Anos Rebeldes reproduz ficção e história real com propriedade e paixão. Entender a profundidade do período do regime militar do Brasil, porém, é algo muito mais complexo e profundo do que a minissérie mostra.

Para isso, nada como boa literatura. Acaba de sair A Ditadura Derrotada, o terceiro volume da série As ilusões Armadas, do jornalista Elio Gaspari. Antes, foram publicadas A Ditadura Envergonhada e A Ditadura Escancarada. Três obras absolutamente fundamentais para entender exatamente o que acontecia naquele período.

Outros livros que valem muito a pena conhecer para saber exatamente o que se passou naquele período político do Brasil são Os Carbonários, de Alfredo Sirkis; O que é isso Companheiro?, de Fernando Gabeira; Ditadura Militar, Esquerdas e Sociedade, de Daniel Aarao Reis; O fim da Ditadura Militar, de Bernardo Kucinski; e Tiradentes - Um Presidio Da Ditadura, de Izaias Almada, Alípio Freire e J.A. De Granville Ponce.

No campo cultural, as expressões afloravam no exterior e no Brasil. Embalados pelos The Beatles e, em seguida, pelos Rolling Stones, jovens ingleses, em primeiro, e norte-americanos, em seguida, transbordavam sua rebeldia ao som do iê iê iê.

Mais tarde, já em 1969, o mundo ainda atordoado com as mortes de Martin Luther King e Robert Kennedy, o início da Guerra do Vietnã e, durante três dias, jovens celebram a paz e o amor ao som de Janis Joplin, Jimi Hendrix, Joe Cocker, entre outros, numa fazenda próxima de Nova York. Era o festival de Woodstock.

No Brasil, ao longo dos anos 60 principalmente, um fenômeno multicultural por um lado, e por outro voltado com profundidade para as raízes do povo brasileiro, aflorava com extrema intensidade. Com sua origem no movimento modernista de 1922 liderado por Mário de Andrade e Oswald de Andrade, e já conhecedores do movimento Antropofagia (que mesclava a cultura tipicamente brasileira com influências externas, de qualquer canto do mundo), uma série de artistas voltou-se já no final dos anos 60 para produzir uma obra capaz de mostrar as contradições do País.

Foi assim no teatro, com a peça O rei da vela de Oswald de Andrade, dirigida por José Celso Martinez Corrêa, além dos famosos, Parangolés, do artista plástico Hélio Oiticica e Roda Viva , de Chico Buarque, também dirigida por José Celso Martinez Corrêa. Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade e baseado no livro de Mário de Andrade mostrava esse avanço também no cinema.

No campo musical, Tropicália, liderada por Caetano Veloso e Gilberto Gil e com participação de Tom Zé e Gal Costa, entre outros, contrapunha-se a Bossa Nova, enquanto por fora corria a Jovem Guarda.

Uma boa leitura em Cultura em Trânsito - Da Repressão a Abertura, de Zuenir Ventura, Elio Gaspari, e Heloisa Buarque de Hollanda pode garantir uma boa explicação do movimento artístico daquela época. Vale também a pena conhecer Da Bossa Nova à Tropicália, de Santuza Cambraia Naves, e Tropicália Alegoria Alegria, de Celso Favaretto.

Na televisão, ou melhor, na TV Record, os festivais de música eram marcados por seu público "politizado", enquanto os "alienados" preferiam outro programa, Jovem Guarda. Deixando de lado paixões e toda a complexidade daquele momento, vale dizer que das "idéias revolucionárias" tentadas por Gilberto Gil e Caetano Veloso e seu movimento Tropicália (narrado pelo próprio Caetano em Verdade Tropical), ou dos casos românticos da Jovem Guarda, o fato é surgem nesse período músicos e intérpretes maravilhosos como Chico Buarque, Nara Leão, Jair Rodrigues, Elis Regina e Roberto Carlos, entre outros tantos nomes.

Enfim, com extrema riqueza cultural e política, como indica razoavelmente bem Anos Rebeldes, os anos 60, especialmente após sua segunda metade, mudaria a sociedade mundial como um todo e, no Brasil, não foi diferente.

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